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Nesta conversa, superacessada pelos internautas, Álvaro Catelan, além de falar sobre o tema, analisa porque a Música Caipira está viva no coração do brasileiro, como sua beleza e poesia estão sendo redimensionadas pelas novas gerações. foto MARCOS LÔBO Nesta conversa, superacessada pelos internautas, Álvaro Catelan, além de falar sobre o tema, analisa porque a Música Caipira está viva no coração do brasileiro, como sua beleza e poesia estão sendo redimensionadas pelas novas gerações. foto MARCOS LÔBO
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– Entrevista com Álvaro Catelan –

Atendendo aos pedidos dos internautas, várias vezes esta entrevista com o professor Álvaro Catelan foi destaque na eNT Revista Eletrônica, na Web. Figura de alma apaixonada, mestre de alto-astral que conheci nas aulas de Literatura – no segundo grau, às vésperas do vestibular para Jornalismo, em 1978 – Catelan há décadas se dedica a pesquisar a Cultura Popular do Brasil e escreveu vários livros sobre o assunto.

 

Durante anos, ele produziu e apresentou um dos melhores programas de rádio do País, chamado “Cantos do Brasil, Recantos de Goiás”, que foi abruptamente encerrado numa mudança de poder no governo estadual, quando medíocres foram substituídos por outros mais insignificantes ainda.
Nesta conversa, superacessada pelos internautas, Álvaro Catelan, além de falar sobre o tema, analisa porque a Música Caipira está viva no coração do brasileiro, como sua beleza e poesia estão sendo redimensionadas pelas novas gerações e lembra nomes que conquistaram o público sem usarem os artifícios da indústria cultural.


NT - Qual a relação da Música Caipira com a contemporaneidade?

AC - O escritor goiano Pedro Gomes escreveu, certa vez, que a moda de viola era o jornal do sertão. Claro que essa era a visão de sua época. Era uma visão relacionada ao universo da comunicação e de sua relação com o homem do interior.
Muitos anos se passaram, aconteceram grandes mudanças de ordem social, no entanto, o homem brasileiro, que tem consciência da importância de sua identidade cultural, jamais vai abandonar suas raízes, as raízes culturais de seu povo.


Em razão dessa consciência é que a Cultura Caipira está cada vez mais presente entre nós, mesmo nos grandes centros através de espetáculos que nos remetem a esse passado distante, ou por intermédio de uma marcante safra de jovens violeiros que cada dia mais mostra a sua cara e talento.
Não gosto de falar em causa própria, no entanto, apresento um programa de rádio com música caipira, pela RBC-FM, em Goiânia, que tem primeiro lugar em audiência no horário.
Outra prova é o espetáculo, Puro Brasileiro, um resgate da cultura caipira, com produção de Marcos Fayad, que faz sucesso tanto no Brasil, quanto no exterior.


NT - E com a identidade do brasileiro?
AC - No universo temático da Música Caipira, o que prevalece é a Saga dos Boiadeiros, Tropeiros, Carreiros e Lavradores; o Misticismo; o Anedotário Caipira e, finalmente, as estórias trágicas de Amor e Morte (“Cabocla Tereza”, por exemplo).
Assim, a temática dessas canções está ligada frequentemente aos problemas da comunidade rural, seu comportamento, seu trabalho, sua religiosidade, seu lazer, seus reflexos socioeconômicos, em síntese, reflete o universo interior do homem brasileiro, sobretudo, do interior, mesmo porque tais canções traçam o perfil e a identidade da gente brasileira.

 

NT- Por que o Centro-Oeste do Brasil se tornou um polo irradiador?
AC - Pelo fato de sermos uma região central e, durante muitos anos distante dos grandes centros urbanos e de sua modernidade, penso que isso nos possibilitou criar uma cultura mais pura, isenta de tantas influências responsáveis pela adulteração dos costumes de nossas comunidades.
Sendo assim, produzimos uma música, cultivamos tradições como Folias, Congadas, Cavalhadas e outros folguedos com maior grau de autenticidade, originalidade onde foram preservados, em alguns casos, elementos da Cultura Indígena, em outros, da Cultura Negra.

Temos que considerar, ainda, a riqueza e diversidade da cultura do Centro-Oeste, em Goiás, por exemplo, encontramos centenas de manifestações da Cultura Popular. É muito bem provável que isso tenha nos dado a condição de um polo irradiador, que continua ainda hoje por meio de outras manifestações culturais também.


NT - Quais são as características da Música Caipira? O que deixa por herança?
AC - A Música Caipira é a mais pura expressão do homem do interior presa ao modo do ser e do fazer de uma comunidade. A autêntica Música Caipira tem como referencial o seu próprio mundo de trabalho, lazer, religiosidade, etc. Está presente na dança da Catira, na Folia de Reis, Folia do Divino, Cururus etc. Mesmo a Moda de Viola, denominação genérica do canto rural profano, não aparece senão acoplada a esse universo temático.
O legado da Música Caipira está, principalmente, na permanente busca do reencontro com as nossas raízes culturais quer na música, no cinema, através de documentários ou, ainda, por intermédio de nosso rico artesanato.


NT- O êxodo rural, contribui para alterar os parâmetros deste gênero musical?

AC - Sim, é claro. O homem rural ao chegar na periferia das pequenas ou grandes cidades é tomado por um sentimento de nostalgia, saudade da vida do campo. Fragilizado, assume comportamento, influências daquele universo sociocultural, fator decisivo para a alteração daquela cultura original.
O próprio rádio, enquanto veículo de comunicação, contribuiu muito também para esse processo de transformação e perda de identidade. É interessante observar, também, que esse homem egresso do campo leva consigo para as periferias das cidades a sua cultura.
Com ele vai o “artesão”, o “violeiro”, o “folião”, por isso mesmo temos até hoje, na periferia de muitas cidades, a presença de grupos de Folias de Reis ou do Divino.


NT - E o inverso... De que forma a Música Caipira influencia a Música Urbana?
AC - Se aqui entendermos por Música Urbana, como a “música sertaneja urbanizada” devemos dizer que essa “música sertaneja urbanizada” foi recriada a partir da Música Caipira, extraindo inclusive alguns de seus elementos básicos do ritmo, da temática e da forma de cantar em duplas. Só que, ao contrário da Música Caipira, “a música sertaneja urbanizada” está voltada muito mais para o lucro, para o forte apelo da indústria cultural.


NT - Como avalia o papel da indústria cultural nas últimas décadas?
AC - Ninguém poderá jamais ignorar a força e penetração da “música sertaneja urbanizada”. Para muitos, a expansão desse tipo de música deve-se, principalmente, a uma dinâmica de marketing, uma estratégia de se criar costumes e hábitos, criando, assim, uma estratégia que envolve sempre lucro e criação e por fim o comprometimento da qualidade do produto artístico.
Atualmente, televisão dá uma atenção muito especial às produções de programas de “música sertaneja”, assim como os espetáculos das “duplas sertanejas” ganharam um formato de superprodução.


NT - O Modernismo no Brasil, no início do século XX, buscou as fontes do mundo rural para as criações artísticas. As novas gerações estão redimensionando a Música Caipira? Quais são as perspectivas?
AC - Vale dizer que na década de 20, Mário de Andrade destacou-se também como um incansável pesquisador e incentivador da Cultura Caipira, do folclore brasileiro. Hoje, modernamente, existem alguns movimentos isolados, alguns por meio da televisão através de produções regionais e, outras manifestações acontecendo em São Paulo, no SESC - Pompéia, outras iniciativas sendo tomadas no Nordeste do Brasil, especialmente, em Pernambuco, sob a orientação de Ariano Suassuna e seus seguidores, como Antônio Nóbrega e outros. De um modo geral, as perspectivas são positivas, creio que devemos acreditar, discutir e, se possível apoiar.


NT - Quais trabalhos você desenvolveu e desenvolve sobre o assunto?
AC - Mantive, durante dez anos, um programa na Rádio Difusora de Goiânia, “Goiás, Canto da Gente”, que era na verdade uma produção para a Fundação Roquete Pinto e para a FUNTEVE. Mais tarde, desenvolvi outro projeto similar na Rádio Brasil Central –AM. Atualmente, desenvolvo a mesma ideia através do programa, Cantos do Brasil, Recantos de Goiás, pela RBC-FM. Em termos de livros, publiquei Ensaios Reunidos – Cultura Popular (Editora Cultura Goiana), mais tarde publiquei Viola Caipira, Viola Quebrada (Kelps) e, mais recentemente, lancei, em parceria com o escritor Ladislau Couto, mais dois volumes: Mundo Caipira (Ensaio, Kelps), e De Repente, a Viola (Ensaio, Kelps), uma publicação da Prefeitura de Goiânia/ Secretaria Municipal da Cultura.


NT - Como surgiu seu interesse pela pesquisa da Música Caipira?

AC - Primeiramente, quero dizer que nasci e passei até a adolescência, no interior de São Paulo, região de São José do Rio Preto, uma região com fortes traços da cultura caipira. Em nossa casa, por exemplo, todos os anos havia pouso de folia de Santo Reis, acompanhando de jantar e cantoria. Mais tarde, já em Goiânia, na década de 80, quando estava cursando o mestrado em literatura brasileira, na UFG, o professor Ático Villas Boas sugeriu que eu fizesse minha dissertação abordando a Literatura de Cordel ou a Música Caipira.


A partir dessa ideia, dei início a várias leituras e pesquisas em torno da cultura popular, enfocando, particularmente, a Música Caipira. Depois, veio o projeto da Funteve, pela rádio Difusora de Goiânia, uma série de artigos para jornais abordando o mesmo tema. Mais tarde, fui convidado por Rolando Boldrin e sua equipe para participar em São Paulo do projeto de definição do perfil do programa Som Brasil, da Rede Globo e por aí vai.


NT - Quais as dificuldades para investigar o tema?

AC - Já foi mais difícil. Hoje você tem maior abertura em termos de acesso e contato com pessoas ou grupos. As maiores dificuldades eram tanto de ordem geográfica quanto social. Lembro-me muito bem das dificuldades encontradas quando fiz a pesquisa sobre Rezadeiras e Cantadeiras de Ladainhas.
Depois, sobre benzedores de cobra, na região norte de Goiás, assim como quando fiz outra pesquisa sobre Folias do Divino, na região de Planaltina de Goiás, ou em Mato Grosso, no entorno de Cuiabá, pesquisando sobre o Cururu. Geralmente as pessoas, os grupos eram muito “fechados” no repasse de informações.


NT - O que considera mais fascinante?

AC - O mais fascinante é sempre a descoberta, o encontro, o contato humano com aquela gente, muitos em completo estado de pureza. Lembro-me da dificuldade para encontrar, na região de Porto Nacional, alguém que ainda conhecia e praticava a Dança do Tambor. Da mesma forma, foi encontrar um grupo que dançava a Dança da Curraleira, na região de Porangatu. Esse encontro é sempre muito rico. Sempre vale a pena.


NT - Quais músicos e canções indica aos internautas interessados em conhecer o melhor da Música Caipira?
AC - De Cornélio Pires até Paraíso, passando por João Pacífico, Raul Torres, Tedy Vieira, José Fortuna, Tião Carreiro, Lourival dos Santos, Donizetti Santos e vários outros podemos elaborar uma enorme lista na qual aparecerão grandes poetas, muitas vezes, autores de uma música bastante singela, porém muito natural, revestida com as formas e temas das coisas mais simples e mais belas que formam o vasto painel da cultura brasileira.
São letras que não demonstram erudição, mas revelam uma arquitetura simples, pura e ingênua que trazem à tona muita emoção através de belíssimas imagens poéticas. São músicas falando do sertão, da roça, do amor, da saudade, do humor e das tristezas e, ao mesmo tempo, revelando um Brasil em preto e branco, bucólico e sentimental.


A poesia dos pousos de boiadas, dos antigos tropeiros, do velho carro de bois é a poesia que se faz presente nessa música de inspiração rural; em nossa música caipira, em nossa música sertaneja de raiz que se revela através do Cururu, do Cateretê, da Moda de Viola, da Querumana, do Pagode ou da Toada.


A lista: Anacleto Rosa Júnior, Angelino de Oliveira, Ariovaldo Pires, Athos Campos, Carlos Erba, Cornélio Pires, Dino Franco, Donizette Santos, Goiá, Jesus Belmino, João Pacífico, João Torres, Joel Marques, Lourival dos Santos, Luis de Castro, Moacir dos Santos, Nono Basílio, Ostecrino Lacerda, Palmeira, Paraíso, Pedro Bento, Redy Vieira, Serafim Colombo Gomes, Sulino, Tião Carreiro, Tião do Carro, Zé Carreiro, Zé do Rancho, Zé Fortuna.


Músicas e Autores: “Cabocla Teresa”, de João Pacífico e Raul Torres; “Mágoas de Boiadeiro”, de Índio Vago e Nonô Basílio; “Chico Mineiro”, de Tonico; “Esteio de Aroeira”, de José Fortuna; “Saudade de Minha Terra”, de Goiá; “Travessia do Araguaia”, de Dino Franco; “Couro de Boi”, de Palmeira e Teddy Vieira; “Menino da Porteira”, de Teddy Vieira; “Recordação”, de Goiá; “Tristeza do Jeca”, de Angelino de Oliveira; “Mourão da Porteira”, de Raul Torres e João Pacífico; “Lembranças”, de José Fortuna; “Peito Sadio”, de Raul Torres e Rubens Ferreira Bueno; “Pagode em Brasília”, de Lourival dos Santos e Teddy Vieira; “Rei do Gado”, de Teddy Vieira; “Chico Mulato”, de Raul Torres e João Pacífico; “Índia”, de Flores e Guerreiro, na versão de José Fortuna; “Boi Soberano” e “Ferreirinha”, de Carreirinho; “Encantos da Natureza”, de Luis de Castro e Tião Carreiro; “Brasil Caboclo”, deTonico; “Amargurado”, de Dino Franco e Tião Carreiro; “O Mineiro e o Italiano”, de Teddy Vieira; “Cavalo Enxuto”, de Lourival dos Santos e Moacir dos Santos; “Viola Cabocla”, de Tonico e Piraci; “Boiada Cuiabana”, de Raul Torres; “Disco Voador”, de Palmeira; “Rio de Lágrimas”, de Piraci, L. dos Santos e Tião Carreiro; “João Boiadeiro”, de Moreninho; e “A Volta do Boiadeiro”, de Sulino.


NT - Gostaria de acrescentar mais alguma questão? Por gentileza, deixe os dados e o contato aos interessados em adquirir seus livros.
AC - Suas perguntas foram muito precisas e abrangentes, portanto, dou-me por satisfeito. Os nossos livros sobre Cultura Caipira podem ser encontrados na livraria da Universidade Católica de Goiás, Área I, Setor Universitário, em Goiânia.


NT - Obrigada pela entrevista. Valeu!
AC - O prazer foi meu poder participar de um trabalho tão significativo como esse que você e sua equipe desenvolvem.

(Entrevista publicada na eNT Revista Eletrônica, www.nadiatimm.com, desde 17 de outubro de 2007).

 

*Esta conto  faz parte do livro "As Novas Histórias de Amor", de Nádia Timm.

Última modificação em Sábado, 07 Janeiro 2017 22:09

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